Dispõe o artigo 7º, inciso XXVIII da Constituição Federal que é direito do empregado o seguro contra acidentes de trabalho, que deve ser providenciado pelo empregador, sem excluir a indenização a ser paga ao empregado vitimado, pelo mesmo empregador, quando este incorrer em dolo ou culpa.
Assim, ocorrendo um acidente de trabalho terá o empregado sempre o amparo da Previdência Social, porque dela é segurado obrigatório, independentemente de perquirir sobre culpa, dolo, ou responsabilidade pelo evento danoso ocorrido.
Já no que se refere à eventual indenização devida pelo empregador ao empregado, em razão de acidente ocorrido no estabelecimento do empregador, esta não é devida automaticamente e em qualquer hipótese, como poder-se-ia supor.
E assim é porque o legislador constitucional condiciona o dever do empregador indenizar o empregado apenas quando for constatado que aquele agiu com dolo ou culpa. Não constatada qualquer das duas hipóteses, não está o empregador obrigado a qualquer ressarcimento.
Trata-se no caso de direito ao recebimento de indenização, quando a agressão decorrer da prática de ato ilícito, capitulado pelos artigos 186 e 187 do nosso Código Civil, assim considerado o resultado danoso decorrente de ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, ou ainda, exercício de um direito com excesso manifesto pelos limites impostos pelo seu fim econômico, social, pela boa fé e pelos bons costumes, nos estritos termos da lei civil.
Ocorrido o dano pela prática de ato ilícito o artigo 927 do Código Civil, cumprindo o mandamento constitucional, determina o pagamento da reparação devida.
E o artigo 932 do mesmo Código responsabiliza o empregador pela reparação civil por ato dos “seus empregados, serviçais e prepostos, n exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão deles.”
Vê-se, desde logo, que não é qualquer acidente que enseja a responsabilidade do empregador, pois é preciso que concorram os elementos necessários para se configurar a responsabilização: a prática do ato ilícito; a presença do dolo ou da culpa; o prejuízo causado e o nexo causal entre o ato praticado e resultado danoso. Ausente qualquer um dos requisitos elencados, torna-se indevido o pagamento da indenização pelo empregador.
Desse modo, podemos ter um empregado acidentado no local de trabalho sem que se configure a responsabilidade do empregador, quando, por exemplo, o ato que cause o prejuízo seja praticado por um colega, no horário de repouso, pela prática de ato que nada tem a ver com a atividade funcional dos empregados.
Veja-se a propósito este caso concreto, julgado pela 7ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, cujo relator foi o Ministro Douglas Alencar Rodrigues, e cuja ementa ilustra, de forma didática e precisa, o tema em debate:
ACÓRDÃO: RECURSO DE REVISTA. ACIDENTE OCASIONADO POR COLEGA DE TRABALHO DURANTE O INTERVALO INTRAJORNADA. AUSÊNCIA DE CULPA DO EMPREGADOR PELO INFORTÚNIO. NEXO CAUSAL NÃO CONFIGURADO. PRETENSÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. IMPOSSIBILIDADE.
1. O ordenamento jurídico pátrio (CF, art. 7º, XXVIII, da Carta Magna) fixou, como regra, a teoria da responsabilidade subjetiva do empregador por danos causados a empregado decorrentes de acidente do trabalho. Contudo, não se cuidando de hipótese de responsabilização objetiva do empregador (art. 927, parágrafo único, do CCB), a reparação perseguida pressupõe o concurso dos seguintes requisitos: ação ou omissão do empregador, culpa ou dolo do agente, dano e relação de causalidade.
2. Segundo as premissas adotadas pelo Tribunal Regional, soberano na análise do acervo fático-probatório, o acidente foi causado por explosão decorrente da inserção de álcool em lata de tinta utilizada pelos trabalhadores para “cheirar fumo”, lata que já contava com brasas acesas, provocando queimaduras no Reclamante que a utilizava naquela instante.
3. Nesse contexto, não é possível reconhecer a responsabilidade do empregador ante a ausência de conduta culposa, omissiva ou comissiva, que guarde nexo de causalidade com o acidente (CC, arts. 186 e 927). Sem prejuízo dos efeitos previdenciários resultantes do infortúnio sofrido (Lei 8.213/91, art. 21, parágrafo 1o), o fato de o acidente ter sido causado por colega de trabalho no local da prestação de serviços não autoriza a responsabilização automática do empregador, com fundamento no artigo 932, III, do Código Civil. Afinal, além de o infortúnio não ter resultado do exercício do trabalho, tampouco em razão, é certo que o acidente ocorreu durante o intervalo intrajornada – momento em que o empregado não está à disposição do empregador, podendo frui-lo para refeição, lazer ou descanso. Durante os intervalos legais, portanto, estando ou não o empregado no ambiente físico da do empregador ou que não tenham relação direta com o trabalho executado, não ensejarão a responsabilidade do empregador. No caso, à luz das premissas fáticas adotadas pelo Regional, não seria possível ao empregador, ainda que diligente e consciente do dever de garantir ambiente de trabalho seguro e saudável aos empregados (CLT, art. 157, I e II), prever ou evitar o acidente ocorrido. Não evidenciados os elementos da responsabilidade civil, consagrados nos artigos 186 e 927 do Código Civil, não subsiste o dever de indenizar do empregador. Divergência jurisprudencial inespecífica nos termos da Súmula 296/TST. Recurso de revista não conhecido. (TST-RR 947-18.2011.5.05.0612, 7ª Turma, Relator Ministro Douglas Alencar Rodrigues).
Como se vê, o egrégio colegiado concluiu que não se configurou a responsabilidade do empregador, eis que o fato ocorreu no intervalo para refeição e descanso, em que os empregados não estão à disposição e sob fiscalização do empregador, já que não estão trabalhando. Além do mais o ato praticado nada teve a ver com as funções profissionais dos empregados, não se configurando acidente em razão dos serviços dos empregados, mas por ação estranha ao contrato de trabalho.
Desse modo, são inaplicáveis os artigos 927 e 932 do Código Civil, porque não provada a responsabilidade subjetiva do empregador. Outrossim, não se cogita de responsabilidade objetiva do empregador, pois igualmente não se aplica ao caso a regra do parágrafo único do artigo 927 do Código Civil.
Por Pedro Paulo Teixeira Manus